segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Consulta Médica - Celso Antunes


Sala de Espera de Consultório. A jovem atendente ouve o interfone e avisa:
- Por favor, dona Alzira Sucupira. O Dr. Epaminondas a espera.
Tímida e parecendo assustada, Alzira entra. Recebe-a um sorriso em uma face gorducha e pergunta: - Então, qual seu problema professora?
 - Apatia, desânimo, desinteresse pela vida. Nada me alegra ou entusiasma, doutor...
 - Isso me preocupa. A apatia é a mais grave das doenças e sem ânimo para os desafios da vida a alma e o corpo de abrem para tudo que é ruim. A senhora sente essa apatia em todas as horas, professora?
 - Não, doutor. Apenas quando entro em salas de aula. Meus alunos são pestes, são irritantes. Conversam o tempo inteiro, não prestam atenção em nada. Passo mais tempo reclamando, brigando, mudando aluno de lugar, implorando pela atenção, mas nada adianta. Como disse, são verdadeiros demônios. Antes doutor, não eram assim. Há vinte anos, quando comecei, eram atentos, entusiasmados, curiosos, adoravam aprender...
 - Bem sei professora. Os tempos são outros. A vida moderna é dinâmica e corrida, as crianças de hoje vivem tempos de agito e aulas que eram interessantes para uma geração já não são mais para outra. Por favor, me informe como a senhora ministra suas aulas?
 - Ora, doutor. Como sempre dei desde quando comecei a lecionar...
 - Mas, querida paciente, voce hoje não se veste, não se desloca, não se alimenta, não se diverte como há tempos atrás. O mundo mudou, o foco de interesse das pessoas mudou e, é claro a aula também precisa mudar. Não se tem mais alunos espectadores, mas crianças e jovens que anseiam ser protagonistas. Não mais ouvintes passivos, mas cérebros que cobram agito, fala, participação, estímulo a Inteligência e prática de competências. Sem isso não há interesse possível...
 - Como o senhor sabe essas coisas, doutor. O senhor por acaso ensina?
 - Infelizmente não, dona Alzira, mas minha esposa e professora e entusiasmada, sempre me fala de suas aulas, dos jogos que aplica, das muitas maneiras que recorre para envolver seus alunos no entusiasmo no desafio, no agito de estratégias de ensino que os faz protagonistas atuantes...
 - Mas, doutor, garanto que sua esposa não ministra aulas em escolas públicas como eu, para alunos como os meus...
 - A senhora está enganada professora. Minha mulher tem muitos convites de escolas particulares, mas diz que se sente mais útil onde está. Não admite abandonar os anjos que ama e admira. Bem, mas voltando a seu caso estou prescrevendo a receita. Aqui está. São apenas algumas pílulas de bom senso, um elixir de modernidade. Não existe nada melhor para sua apatia. Volte daqui um mês e garanto que enxergarei outro brilho em seus olhos. Até logo.

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